João Cléber de Souza Torres (MDB), prefeito de São Félix do Xingu, no sudeste do Pará; o capitão da reserva Raimundo Pereira dos Santos Neto – que coordenou, por indicação de Jair Bolsonaro, a Fundação Nacional do Índio (Funai) no estado; e Gaspar Francisco da Silva, apontado como grileiro, são alvo de uma ação do Ministério Público Federal (MPF).

O órgão pediu à Justiça Federal nesta sexta-feira (12) a condenação deles pela abertura de uma estrada de terra, para dar apoio ao garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Apyterewa – a mais desmatada do Brasil em 2019 e em 2020.

A ação quer ainda que Gaspar, João Cléber e Raimundo também paguem mais de R$ 2,2 milhões de multas aplicadas.

Na ação, o MPF pede que João Cléber de Souza Torres (prefeito), Raimundo Pereira dos Santos Neto (integrante da Funai), Gaspar Francisco da Silva regenerem áreas desmatadas, retirem seus representantes e cessem qualquer atividade econômica no local.

Desmatamento na TI Apyterewa no Pará. À esquerda, área devastada em 2020. À direita, derrubadas em 2022. — Foto: Reprodução / Imazon

Área desmatada

Já à Prefeitura de São Félix do Xingu, que se abstenha de prestar serviços ou dê anuência para a realização de obras no local e que preste informações de obras autorizadas ou realizadas entre 2017 e 2023.

Com relação à Funai, que monitore a área da fazenda “Promessa”, a fim de identificar possíveis atividades como expansão da área desmatada ou uso controlado do fogo.

O MPF também requer que o valor do rebanho comercializado por Gaspar da Silva seja revertido à Associação Indígena Tato’a.

A TI Apyterewa é ocupada pelos Parakanã e teve a demarcação e delimitação das terras realizadas pela Funai em 1991. Porém, apenas em 2008 a demarcação foi finalizada. De acordo com o MPF, a retirada de não indígenas da área ainda não foi concluída.

 

‘Ocupação de má-fé’

Segundo as investigações, a maioria dos ocupantes não indígenas da TI Apyterewa estão lá de má-fé ou são grileiros que nunca foram completamente retirados da área.

Em 2011, a Funai publicou resolução adotando “marco temporal de boa fé”. Então, para o MPF, restaria presumida a má fé das pessoas que ingressaram na terra após dezembro de 2001.

Entre 2011 e 2017, foram organizadas operações para efetivar a desintrusão da área, mas não tiveram sucesso pela “ineficiência do Poder Executivo, decisões judiciais protelatórias e ação violenta de grileiros da área”, de acordo com a procuradoria.

O MPF afirma, na ação, que centenas de invasores vêm se somando aos ocupantes, especialmente a partir de 2017, como é o caso do réu Gaspar Francisco da Silva.

De acordo com o documento, o município de São Feliz do Xingu “vem autorizando obras locais em benefício dos invasores, de maneira inconstitucional e ilegal, o que contribui ao avanço do desmatamento e para a continuidade das invasões”.

Operação de combate a crimes ambientais na TI Apyretewa, no Pará. — Foto: Reprodução / Ibama

A estrada vicinal dentro da terra indígena, autorizada pelo réu Raimundo Pereira dos Santos Neto, da Coordenação Regional Kayapó do Sul do Pará (CR-KSPA), é um desses casos. O MPF constatou que ela beneficiaria uma fazenda de Gaspar.

 

Estrada ilegal

A cidade de São Félix do Xingu fica distante mais de 1.000 km de Belém. A TI Apyterewa do povo Parakanã tem o território todo dentro do município.

A área foi alvo de um suposto acordo envolvendo o prefeito João Cléber para a reconstrução de uma estrada que daria apoio ao escoamento do garimpo ilegal dentro da reserva indígena, segundo o MPF.

Um dos réus da ação, Raimundo Neto, foi um dos militares que ocuparam a Funai por indicação no governo Bolsonaro.

Em 2020, o capitão da reserva emitiu ofício ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) sobre a criação de uma base de apoio aos indígenas próximo ao rio Iriri.

Meses depois, o local foi alvo de uma operação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), por dar apoio a crimes ambientais. (Fotos: Ibama/Reprodução)