Repórteres Lucas Altino e Thiago Prado, do jornal O Globo, conversaram com o governador Helder Barbalho sobre o atual estágio de organização da COP-30, que será realizada em Belém no período de 10 a 21 de novembro deste ano.
Na entrevista, Helder garante que toda a infraestrutura estará pronta a tempo.
Questões como a ampliação da rede de hospedagem e de obras urbanas, pauta de preocupações e críticas internacionais, também estarão todas solucionadas até lá.
Segundo os dois repórteres, na entrevista, Barbalho destacou que a “COP não é nem de esquerda, nem de direita”.
Leiam abaixo parte da longa entrevista do governador:
Belém hoje tem cerca de 25 mil leitos, mas são esperados até 50 mil visitantes na COP30. Vai dar tempo da rede ser ampliada?
Não só a parte de hotelaria, como todas as nossas obras estão dentro dos prazos. Até antes, porque nós vamos começar a entregar parte do Parque da Cidade, nosso principal equipamento para a COP, em maio. Apesar da estimativa de 50 mil pessoas, temos uma distribuição durante os 12 dias de evento. Temos um ápice de demanda, que é o dia costumeiramente da fotografia dos líderes, que gira próximo de 25 mil visitantes. Quando falo 50 mil leitos, estamos falando de todos os tipos.
E quais são as estratégias?
Primeiro a modernização dos leitos existentes. Segundo, conseguimos atrair novos hotéis. Há a implementação de quatro hotéis de alto padrão, parte em prédios públicos que foram feitas concessões e estão já com mais de 70% de obras. Outro importante caminho são os navios, e o governo federal anunciou a disponibilização de dois navios (usados como hotéis marítimos). Além disto, temos as plataformas de aluguéis de temporada. Nós tínhamos 700 imóveis disponíveis e hoje estamos com mais de 5 mil. Também estamos construindo uma vila de líderes anexa ao local do evento, com mais de 400 leitos de altíssimo padrão. E nós estamos com 17 escolas no raio do evento sendo estruturadas para serem “áreas hostess”. Portanto, são várias estratégias que nos dão a certeza de que teremos as ofertas.
Os preços das hospedagens têm sido alvo de reclamações. Há diárias de até R$2 milhões, o que o governo pode fazer para controlar isso?
Temos o desafio de colocar todos esses leitos à disponibilidade, para que haja uma acomodação dos preços. Num primeiro momento, pela oferta baixa, a gente teve preços bem altos. O governo deve atuar através de defesa do consumidor, Procon, para cumprir o papel de evitar prejuízos ao consumidor. Agora, você tem um padrão em todo o calendário de grandes eventos, é natural, temos que compreender. E sem preconceito, porque também não se pode querer imputar a Belém como se fosse pela primeira vez na história esse aumento de preço. Os preços nos hotéis em Baku e Dubai (sedes das últimas COPs) eram absolutamente elevados. No Rio de Janeiro, por exemplo, no G20, as tarifas hoteleiras aumentaram de preço. Com a Lady Gaga que vai tocar aí no Rio agora no início de maio. É natural.
Distribuição dos leitos
- Hotéis: 16.000
- Navios: 4.700
- Plataformas de hospedagem: 13.000
- Escolas, alojamentos, vilas militares e outros: 16.600
Nos últimos meses chegou a se falar sobre risco de a COP sair de Belém por causa desses desafios. Isso é um risco real?
Não há hipótese, isso é uma etapa vencida. Havia uma especulação, mas o evento acontecerá integralmente em Belém. O que não impede, e eu estimulo inclusive isso, que outras cidades possam se habilitar. Se algum líder global quiser ficar em São Luís, quiser conhecer Macapá, Santarém, Marabá, isso tudo é muito muito interessante.
Além dos preços dos hotéis, há uma inflação em custos locais, como na construção civil, nos alimentos, até no açaí. Te preocupa um efeito negativo na população do Pará?
Eu analiso sobre o ângulo do aquecimento econômico, que é transversal. Da mesma forma que você tem um preço que possa aumentar de mão de obra da construção civil, você tem uma empregabilidade extraordinária. É uma transformação que a cidade está vivendo, e isso envolve construção civil, comércio, serviços. Pela estimativa do PIB do Brasil de 2025, o Pará é o terceiro estado em crescimento, isso nunca aconteceu. Nesse primeiro trimestre, foram abertas 26 mil empresas, principalmente micro e pequenas empresas, as pessoas estão enxergando as oportunidades. Com relação à questão alimentar, o açaí é cíclico, é natural que na entressafra haja um aumento de preço. E há um outro incremento, que é a demanda por açaí no mercado internacional. O que temos trabalhado é o incentivar a ampliação produtiva, até porque o açaí e o cacau são os nossos grandes cases de produção sustentável do estado.
Como está o sentimento do paraense em relação ao evento?
Eu diria que nós temos três sentimentos. Há um sentimento extraordinário de orgulho. Há um sentimento de que as obras trazem um inconveniente na mobilidade. As pessoas entendem que é necessário, mas registram de que é muita coisa ao mesmo tempo, então está causando dificuldades. E há um, que é gradativamente transitório, que é: Vamos conseguir entregar as coisas? Um processo de transição que gera uma desconfiança inicial, se nós vamos dar conta de entregar. Mas é um processo gradual de percepção de que as coisas estão ficando prontas, portanto faremos bonito.
Como fazer para que o evento gere um legado para a população?
Todos os investimentos partem do princípio de que precisam ficar para a população local. É o grande ensinamento do que não se deve fazer a partir dos equipamentos da Olimpíada, que agora tem soluções de escolas, mas teve, no pós-Olimpíada, uma fotografia de baixa utilidade. Aqui nós tivemos sempre o cuidado de todas as soluções partirem do princípio da necessidade de momento, mais de um legado pós evento. Mobilidade urbana com novas avenidas, novos ônibus, terminais de passageiro do aeroporto, terminais hidroviários, terminais regionais e internacionais de navegabilidade dos rios, parques urbanos, a Vila da COP, que vamos transformar em escritórios. Não quer dizer que não vamos continuar tendo problemas urbanos naturais de um grande centro da América Latina. Mas certamente vamos poder olhar para trás e fazer um comparativo de como era Belém antes e como será depois da COP. Eu não tenho dúvida de que a visibilidade que Belém está tendo permite com que a cidade passe a ser a o principal destino turístico daqueles que buscam experiência na floresta, na natureza. O aeroporto de Belém no último ano teve 4,3 milhões de passageiros, foi o maior número. Isso já é fruto desse momento pré-COP. Somado aos equipamentos públicos sendo implementados. A visibilidade de ser capital do maior evento climático na Amazônia é a grande oportunidade.
Adversários políticos criticam investimentos para a COP como prioridades que seriam equivocadas frente aos problemas sociais, mesmo que muitos gastos sejam privados, como no show de Mariah Carey no evento Amazônia Para Sempre. Como responder a essa narrativa?
Primeiro não estamos investindo recursos públicos nesses eventos (de música). E esses eventos trazem retorno econômico para a cidade. Em paralelo a isto, as soluções que estamos dando para a cidade são importantes e repercutem como legado social. Não são voltados para 12 dias de evento e sim para um legado para a cidade. Com relação a críticas, nós vivemos numa democracia. Temos que lidar com isto de forma sempre atenta, e, se tiver fundamento, fazer uma auto crítica e corrigir eventuais erros. E, claro, rebater as fake news, o grande problema é que hoje nós temos uma produção de desinformação, e aí é uma luta inglória.
Sobre as negociações climáticas, que afetam a preservação da Amazônia e oportunidades econômicas para o Pará, qual o peso da postura do governo dos EUA, com Trump?
É natural que tudo aquilo que o governo americano sinaliza gere movimentos, em qualquer setor. O que eu tenho defendido é que nós temos que ter foco com a iniciativa privada americana, que mantém suas metas de neutralização de emissões. Também devemos dialogar com os estados subnacionais, por exemplo, a Califórnia e o Texas. Terceiro ponto, o governo americano sai do acordo de Paris, mas não sai da COP. E aí nós devemos apostar num comportamento diplomático e não gerar acirramento dentro dessa estratégia que tem sido uma prática comum do novo governo americano. Nós não devemos valorizar este tipo de comportamento. E por por último, monitorar se o mercado financeiro, se as grandes empresas irão ou não retroceder. Nós devemos apostar no diálogo, até porque, independente de ser um governo republicano ou democrata, o governo americano muito pouco tem feito em favor do financiamento climático no mundo. Nas relações com o Brasil, a Noruega é o nosso principal parceiro no financiamento climático.
O Trump vem ao evento?
A interpretação é de que ele deve mandar delegação. Mas acho que o Brasil tem que insistir na presença do presidente Trump. E que possamos construir soluções que estejam em aderência às responsabilidades e as urgências ambientais. Os eventos climáticos estão transformando um novo normal, e os Estados Unidos é um dos alvos . Não podemos estar à margem desta realidade. Quando uma queimada chega, quando uma enchente atinge alguém, ela não pergunta se este alguém é de direito ou é de esquerda, portanto não cabe negacionismo ambiental.
————————
Nota do Blog: Interessados em ler a entrevista em sua integridade, acessar neste link (para assinantes)