João é mecânico, 49 anos, tem cinco filhos, trabalha numa terceirizada de uma guseira de Marabá, irmão do mestre de obra de um prédio em construção ao lado de minha casa.
Na sexta-feira, antes das 19 horas, andando pela erma rua da retirada Folha 5, na Nova Marabá, rumo à sua residência, João era facilmente identificado como um operário. O ar de quem estivera trabalhando desde às seis horas da manhã, a roupa pedindo outra, o radinho de pilha sintonizado na Clube e o detalhe da marmita embaixo do braço e embrulhado em folhas de um jornal.
Três marmanjos, andando em sentido contrário, com seus respectivos tresoitões nas cinturas, soltando faíscas pelos olhos, eram ainda mais identificados como perigosos assaltantes à mão armada.
Assim que o pobre operário os viu, estremeceu nas bases e pensou alto:
– Minha Nossa Senhora!
A santa, entretanto, não deve ter ouvido, pois teria barrado os passos dos bandidos, que avançavam ameaçadoramente. Logo que se viu cercado, o homem tentou correr, ocasião em que ganhou catiripapo no pé do ouvido, que o prostrou por terra. Ainda no chão, ouviu um revolver em sua nuca dizer que era melhor ficar quietinho, para não virar presunto.
Um dos assaltantes pediu um cigarro, recebendo um “eu não fumo, não senhor”. Novo catiripapo se fez sentir no operário, que é para aprender a fumar. O chefe do trio, caolho do lado esquerdo, desdentado, botou o revólver na cintura e disse:
– Sabe, amigão, gostei muito do teu rádio.
– Não faça uma coisa dessas – gaguejou o coitado -, esse rádio foi comprado com o suor do meu trabalho, ainda to pagando ele e não vou deixar cês levar ele não.
– Seguinte, filho-da-puta, vai sim – rosnou um dos meliantes. Você sabe que pra gente é difícil de adquirir um objeto igual a este, pois temos problemas com o SPC. Assim, você empresta ele pra gente.
Dito isto, arrebentou-lhe o “papagaio” da mão.
– Agora, ó meu, vai passando o dinheiro porque eu já estou perdendo a paciência.
Não havia a mínima razão para o marginal perder a paciência, visto eu o operário não estava opondo muita resistência, mas bandido adora dizer que está perdendo a paciência que é para impressionar. Se bem que na maioria das vezes, mesmo sem perder a paciência, apertam em cima de qualquer um, pum.
– Bem, eu só tenho o troco do ônibus.
– O quê? Tais a fim de fazer hora com a nossa cara? Então a gente perde um tempão e o praça vem me dizer que só tem meia dúzia de moedas?
O terceiro assaltante, que ainda não tinha falado, aproveitou e grunhiu:
– Ô rapaz, então tu não sabe que a gente ta sabendo que tu recebeu hoje?
– Cume que vocês sabem?
– O SMI – Serviço Marginal de Informação -, bateu pra gente.
– Eu botei o dinheiro no banco, respondeu João, imaginando que nesta segunda-feira, 9, teria que dar R$ 150,00 para a esposa levar a filha doente, de 5 anos, ao médico.
Depois de o revistarem dos pés a cabeça, o trio falou uníssono:
– Não leva a mal, não, mas a gente pode saber o que o distinto ta carregando aí na marmita?
– Sobra de arroz, feijão, farinha e sardinha.
– Então abre que é pra gente vê.
Diante da indecisão do operário, o bandidão-mór tirou-lhe a marmita das mãos, abriu e deparou com R$ 657,00, o que sobrou depois dos descontos de INSS, vale adicional, e alguns etecéteras .
– Ah! – sorriu de satisfação o vil chacal. – Querendo esconder a grana da gente, né? Tira a roupa.
– A roupa, não!
Depois do pescoção, começou a tirar, ficando pelado em plena via pública. Antes de fugirem com a roupa, os três ainda brincaram:
– Cuidado pra não ficar resfriado.
Do jeito que estava, João saiu correndo em busca de socorro, quando topou de cara na esquina com um veículo da PM circulando no bairro, que tinha acabado de passar pelos três cavalheiros simpáticos que ouviam um rádio de pilha dentro de uma marmita. Antes de conseguir exprimir alguma coisa, João ganhou voz de prisão.
– Tais pensando que está no paraíso, para ficar andando nu pela rua? – esbravejou o nobre policial.
A vítima só foi conseguir contar a sua história dentro de sua casa, para onde foi levada pelos policiais ao pedir que antes de ser conduzido à delegacia acreditasse na idoneidade dele, conhecendo a família que mora na Folha 5.
Hiroshi Bogéa
8 de junho de 2008 - 22:12Verdade, Juva.
Tudo bandido… E blindados!
Quanto ao filhote seu, graças está bem. Nenhum mal físico lhe foi cometido.
Vão-se os anéis; ficam os dedos.
Um abraço e boa semana.
Como foi a palestra em Santarém?
Juvencio de Arruda
8 de junho de 2008 - 17:05Bogéa, meu filho caçula foi assaltado pela quarta vez em cinco anos no sábado. Perdeu o quarto celular, e um mp3. É assim nessa terra, onde o bando que age fora do estado disputa com o bando que age dentro do estado para ver quem ganha.
Tudo bandido!
Hiroshi Bogéa
8 de junho de 2008 - 16:5312:29 PM, obrigado.
As crônicas diárias estão aí mesmo vividas por cada cidadão. É o mundo cão real maltratando a todos nós.
Abs
Anonymous
8 de junho de 2008 - 15:29Meu caro Hiroshi;
Já faz algum tempo que eu acesso o seu blog, e dou uma olhada diária nos assuntos postados.
Com relação a esta descrição do fato (roubo), é um fato digno de reconhecimento pela forma honesta e detalhista como vc descreveu, só mesmo uma pessoa que vive esta situação de assombro com a violência na nossa cidade é que tem noção daquilo que voce descreveu. Acredito que esta descrição poderia sair em jornais de grande circulação, pois isto retrata muito bem o nosso dia dia.
Diante disto tudo eu pergunto o que as autoridades e também a sociedade organizada vai fazer, amanhã esta experiência vivida por este operário poderá ser vivida por qualquer um de nós.
Parabéns Hiroshi.