Permita, leitor, fazer uma obrigatória homenagem a uma das pessoas mais extraordinárias que eu conheço, convivi e a tenho no restrito círculo dos raros personagens humanos.

Trata-se de uma tia, a mais velha entre todos os filhos de meus avós Tufy e Tunica Gaby.

Tia Terezinha, que na data de 22 de setembro completou 94 anos.

Ela representa o melhor exemplo de alguém que veio ao mundo para semear bondade,  persistência e determinação, e, principalmente,  não deixar a “peteca cair” na condução solitária de uma ninhada de 12 filhos.

Mal completara 38 anos, exatamente no ano de 1968, minha amada tia perdeu o marido,  quando o caçulinha da ninhada nem havia completado 6 meses de idade.

Cezinha, o último dos 12 filhos da família, não teve tempo de conhecer o pai, tio Coriolano Rocha, que morreu aos 46 anos.

Agora processem na cabeça de cada um de vocês o que se espraiou  à frente de uma jovem mulher, àquela época com 38 anos, desafiada pelos dissabores da vida a cuidar de 12 filhos, sozinha!

Sem nenhuma experiencia profissional que lhe desse o Norte de como produzir capital destinado a alimentar, educar e direcionar cada filho, tia Terezinha tocou em frente, sem saber realmente onde pisar com segurança.

Mas foi indo, caindo aqui e ali, persistente,

La pelos finais dos anos 70, eu assisti de perto a batalha diária de tia Terezinha.

Recém chegado a Imperatriz, morei numa casa que ficava ao fundo do quintal da residência de minha tia.

Naquele quintal, diariamente, jogávamos futebol, eu e meus primos.

A casa deles passou a ser a extensão da minha.

Quase  todo dia, nas horas do almoço e jantar, eu era chamado para sentar à mesa com a “primaiada”- todos perfilados numa imensa mesa que deveria medir  uns oito metros, com bancos longos de madeira, um em cada lado da mesa.

Ali, naquela mesa, este blogueiro “fila-bóia”  aprendeu os segredos da multiplicação dos pães.

Sim, tia Terezinha, com extrema  disciplina, fazia a refeição do dia render o suficiente para alimentar cada um dos filhos e filhas.

Da ninhada de 12 filhos, pelo menos dois estudavam fora, mais precisamente em Belém, ficando aos cuidados direto de minha tia os outros dez meninos e meninas.

Lembro bem: todos se sentavam à mesa, enquanto  lá na cozinha tia Terezinha arrumava o prato de cada um e trazia, devidamente medido, para não sobrar e nem faltar – servindo exclusivamente para conter a fome de cada.

Não havia  “luxo” de nenhum dos filhos ter o direito de se servir novamente.

O que tia Terezinha servia no prato, era aquilo, naquela medida.

Quantas vezes minha tia pedia pra eu ir na esquina comprar pães, por volta de 3 da tarde, para servir um pequeno lanche a cada filho?

Ela partia o pão ao meio, passava uma pequena quantidade de manteiga e servia com “Ki Suco’, um tipo de saquinho de pó de fruta que, misturado à agua e açúcar, resultava num gostoso “refrigerante” de pobre.

Cinco  pães alimentavam dez filhos.

A luta de tia Terezinha, ao longo dos 58 anos após a morte de tio Coriolano, foi de uma mulher heroica.

E recompensador!

Hoje ela tem filhas, netos e bisnetos formados na área de medicina – especialização preferida da maioria dos familiares, e que estão agora cuidando da saúde dela!

Também perdeu 3 filhos, na viuvez, todos jovens, cujas perdas marcaram dramaticamente a vida de nossa tia.

Tio Coriolano Rocha, falecido em 1968

Até aos 90 anos, minha tia  mantinha o hábito de  fazer périplos pelas  cidades de Marabá, Imperatriz, São Luís e Belém, locais para onde viajava, sozinha, visitando filhos – viagens programadas a  cada três meses.

Não importava qual o transporte utilizava: avião, ônibus, de carona em carro de algum parente…

Também até os 90 anos, nossa heroína mantinha o disciplinado hábito de andar, exercitar o corpo pelas ruas de Belém, andando devagarinho.

Há menos de um ano, uma queda mudou a rotina saudável de nossa tia.

Ela ainda luta para recuperação de seu caminhar.

Aos 94 anos, completados nesta sexta-feira, Terezinha não perdeu a fé na vida, rodeada de amor e afeto dos filhos, netos e bisnetos, que  a ofereceram uma jantar numa casa de eventos, em Imperatriz.

Pelo telefone, festejei a data conversando com minha tia, que se revelou feliz pela quantidade de pessoas presentes ao jantar.

Disse-lhe ser um privilégio para ela  ter família “por todo canto”,  tanta gente na família, ficando até difícil conciliar o tempo que passa com cada um.

Minha amada tia apenas sorriu, e pelo celular deu pra sentir que ela concordou com meu testemunho.

Terezinha Gaby Rocha é uma grande referência de vida.

Ponto de referência e de sabedoria.

É gostoso ouvir tudo o que ela tem para ensinar: fonte de sabedoria que faz bem a quem bebe seus ensinamentos todos os dias.

Pelos desencontros da vida, raramente venho tendo o prazer de ter mais contato com ela, mas celebrar virtualmente seus 94 anos  deu uma sensação  suave de conforto e agradecimento pelo que ela nos representa.

Longa vida, tia amada!

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Atualização 25/09 (15h54)

Em um parágrafo do texto acima, foi feita atualização para corrigir informação sobre a queda sofrida pela nossa amada tia. O acidente ocorreu há três meses atrás, ao contrário do que foi escrito originalmente.