O ex-prefeito João Salame mais uma vez reconheceu que é difícil a situação financeira da prefeitura de Marabá, mas faz várias ponderações  a respeito da dívida apresentada por seu sucessor e reafirmou que deixou a prefeitura muito melhor do que recebeu, inclusive com mais de R$ 300 milhões de recursos garantidos para investimentos. Confira entrevista concedida por Salame.

 

Salame

O prefeito Tião Miranda, em entrevista coletiva concedida esta semana, disse que a dívida consolidada que recebeu da prefeitura é da ordem de R$ 145 milhões, fora os fornecedores. O senhor concorda com esses números?

Salame – Sobre fornecedores, como ele mesmo disse que não vai pagar, não tem como a gente tratar. Mas nos números divulgados algumas coisas chamam atenção. Ele relaciona mais de R$ 16 milhões de dívidas anteriores a 2012, portanto antes do nosso governo. Elenca precatórios de mais de R$ 14 milhões, a maioria de dívidas questionadas judicialmente no primeiro governo dele. O volume já cai, portanto, para algo em torno de R$ 113 milhões. Desse total, cerca de R$ 55 milhões seriam com Folha de Pagamento, consignados, plantões médicos e vale alimentação. Essa dívida, se realmente for esse o valor, já inclui a folha de dezembro e gera uma forte pressão política dos servidores. Mas, quero destacar duas coisas: eu fui afastado em 5 de maio do ano passado. Deixei a folha de abril dos concursados paga, que é a maior parte, e faltando apenas R$ 9 milhões pra completar o pagamento da folha, que eram os salários de contratados e comissionados. Numa reunião com dirigentes do Sintepp que reclamavam de salários atrasados, lembrei a eles que, quando fui afastado, a folha estava em dia.

E quando o senhor retornou?

Salame – Retornei no dia 8 de agosto e a folha de julho, no valor de R$ 32 milhões, não havia sido paga. Nem um centavo. E o meu vice deixou em caixa apenas R$ 2 milhões. Ou seja, entreguei faltando R$ 9 milhões pra pagar a folha do mês e recebi faltando R$ 30 milhões. Isso sem falar de quase R$ 4 milhões que ele descontou administrativamente dos professores. Ou seja, encontrei um buraco de R$ 34 milhões na folha. Em relação ao que eu deixei, um crescimento de R$ 25 milhões no déficit.  Faltando apenas 5 meses para terminar o governo. Ou seja, dos R$ 55 milhões que estão dizendo que existe de dívida R$ 25 milhões foram produzidos nos três meses em que fiquei afastado. Portanto, já cai para R$ 30 milhões nossa responsabilidade. Pelo ritmo que ia era para terminar o ano com os R$ 34 milhões de déficit na folha que recebi mais o 13º salário, o que daria um déficit de mais de R$ 60 milhões. Por outro lado, eu paguei de dívidas do governo anterior com a folha exatos R$ 38.244.876,17 (trinta e oito milhões, duzentos e quarenta e quatro mil, oitocentos e setenta e seis reais e dezessete centavos). Se você atualizar esse valor vai dar mais de R$ 50 milhões de reais que eu paguei só com salários e consignados atrasados.

E as outras dívidas que foram relacionadas, o senhor questiona?

Salame – São todas questionáveis. Os quase R$ 2,5 milhões de dívidas com o INSS têm decisão judicial favorável ao município e compensação aprovada pela Procuradoria Geral do Município. Um valor de compensação inclusive maior que esse, de tributações que comprovadamente o município pagou desnecessariamente. Portanto, tem é crédito para o novo governo usar nas parcelas do INSS que ainda vão vencer. Os R$ 18 milhões de dívidas parceladas com o Ipasemar no próprio relatório eles informam que já está com 5 parcelas pagas. Ora, qual é o prefeito que não pega parcelamentos para pagar? Eu paguei parcelamentos que vêm desde o governo do Haroldo Bezerra. Essa é a realidade de quase todos os municípios e estados brasileiros. Quem entra na disputa já sabe que vai encontrar isso. Quanto ao restante da dívida, que é com o Ipasemar, de cerca de R$ 29 milhões, ela está sendo questionada judicialmente e as chances de vitória são grandes. Sem falar que a qualquer momento o Governo Federal deve abrir um Refis para que seja feito parcelamento. Só que, repito, essa dívida é ilegal.

Porque é ilegal?

Salame – A progressão de mais de mil servidores foi feita sem concurso público, o que é terminantemente vedado, inclusive com súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal. Ora, se as progressões são ilegais, os aumentos também foram. E, consequentemente, se pagou previdência a maior. Eu entrei com ação solicitando a devolução desse dinheiro repassado ao Ipasemar que foi pago a maior. E o novo governo sabe que a possibilidade de derrubar judicialmente esses aspectos inconstitucionais do PCCR é muito grande. Portanto, a dívida que o novo governo tem realmente que se preocupar é de cerca de R$ 55 milhões, se os números que eles divulgaram estão realmente corretos. Ora, eu paguei R$ 75 milhões de dívidas. Já apresentei relatório demonstrando isso. Não que a dívida fosse só essa. Não! Isso foi apenas o que eu paguei. Agora atualize esse dinheiro! Vai dar cerca de R$ 100 milhões. Portanto, apesar de difícil e de exigir medidas duras que o novo governo tem que tomar, a situação é muito melhor do que eu recebi.

Quando essa situação começou a ficar fora de controle?

Salame – Em 2013 e 2014 eu paguei a maior parte da dívida, a folha estava em dia e a previdência também. E estávamos tocando muitas obras. O problema começou em meados de 2015, quando a arrecadação despencou em função da crise econômica do País. Repito. Chegamos a arrecadar cerca de R$ 54 milhões em um mês nos dois primeiros anos de governo. Em setembro último a arrecadação foi de R$ 40 milhões. Qual a administração que resiste a isso? E olha que os royalties cresceram no período, só que esses recursos não podem ser usados para pagar salários e previdência. Quando a receita despencou e, em função do PCCR da educação os benefícios foram aumentando, criou-se uma situação explosiva. O déficit na saúde também é muito alto. Por isso comecei a deixar de pagar o Ipasemar e me concentrei em pagar os salários e não deixar a máquina parar. Por isso eu fui afastado: o único prefeito do Brasil afastado por atrasar o pagamento da previdência, coisa que todos os empresários e governantes fazem quando a crise aperta e a receita cai.

O presidente da Acim (Associação Comercial e Industrial de Marabá), Ítalo Ipojucan,  disse no site da entidade que a situação financeira da prefeitura é de desordem e que se chegou a isso pela pressão dos sindicatos e falta de pulso do senhor. O que o senhor tem a comentar sobre isso?

Salame – Tenho muito apreço pelo Ítalo e se é que ele deu mesmo essa declaração vou deixar de lado a provocação. Vamos aos fatos. Como disse a situação começou a complicar em meados de 2015. Mandei fazer uma auditoria na folha da educação, que foi concluída em novembro e constatou a ilegalidade das progressões. O que eu fiz? Editei um decreto pra mandar cumprir a Súmula Vinculante do STF. Fizeram uma votação na Câmara. Fui derrotado por 11 votos a 8. A maioria dos votos contrários de vereadores ligados ao grupo do atual prefeito. Não satisfeito, recorri ao Poder Judiciário. Em fevereiro do ano passado fui à Justiça para derrubar essas progressões ilegais. Não tive medo de enfrentar o problema em pleno ano eleitoral. Portanto não fui omisso. Não faltou pulso. Mas não sou ditador. Vivemos numa democracia, que depende do Legislativo e do Judiciário para funcionar. Quanto à relação com os sindicatos me orgulho de ter feito um governo com reuniões permanentes e participação deles em diversos momentos importantes. De quando foi possível ter concedido benefícios aos servidores no vale-alimentação, no reajuste salarial, de ter pagado os salários e outros benefícios atrasados em poucos meses e sem recorrer à Justiça, sobretudo em 2013 e 2014 quando a situação financeira era melhor. O engraçado é que conheci o Ítalo em Goiânia. Ele era sindicalista das alas mais combativas do sindicato dos bancários. Pelo visto, se ele disse isso mesmo, a vida de empresário mudou bastante as ideias do meu amigo.

 

O senhor tem dito que deixou muitos recursos para nova administração. Que recursos são esses?

Salame – Recursos garantidos. Gostaria que você publicasse até os centavos. Vamos lá. R$ 191.056.963,61 (Cento e noventa e um milhões, cinquenta e seis mil, novecentos e sessenta e três reais e sessenta e um centavos) pra obras de águas e esgoto em São Félix, Morada Nova e região da Grota do Aeroporto. Esse dinheiro já está aprovado no Orçamento Geral da União, sem contrapartida, já empenhado e autorizada a licitação pelo Ministério das Cidades e Caixa Econômica Federal. Para pavimentação de 20 bairros na Nova Marabá e Cidade Nova deixamos R$ 46.007.235,59 (quarenta e seis milhões, sete mil, duzentos e trinta e cinco reais e cinquenta e nove centavos). Dinheiro depositado na Caixa Econômica Federal. Obra já em andamento que foi paralisada porque não tínhamos a Certidão Negativa do Ipasemar. Mas, no final do nosso governo, consegui a liminar na Justiça determinando que a Caixa faça os pagamentos sem precisar dessa Certidão. Portanto, já no início do verão, o novo governo vai poder deslanchar esse arrojado programa de asfaltamento. Para a Grota Criminosa, cujas obras estão em estágio avançado entre as folhas 23 e 26, inclusive a folha 23 já foi quase toda asfaltada, deixei R$ 27.483.646,49 (vinte e sete milhões, quatrocentos e oitenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis reais e quarenta e nove centavos). Obra importantíssima para acabar com os alagamentos na Nova Marabá. Já estão depositados na conta da Fundação Casa da Cultura e com Ordem de Serviço, cerca de R$ 11,5 milhões de reais para a construção de um moderno Cine Teatro ao lado do Ginásio da folha 16. Deixei R$ 7,5 milhões que serão pagos pelo Banco do Brasil em função da negociação que fizemos para a instituição abrigar a folha de pagamento da prefeitura. Também está aprovado, empenhado e licitado recurso para construir um Centro de Iniciação Esportiva na Folha 6, no valor de R$ 4.771.547,00 (quatro milhões, setecentos e setenta e um mil, quinhentos e quarenta e sete reais). Ainda restam cerca de R$ 4,5 milhões de reais do convênio que firmamos com a Companhia Vale para a conclusão dos postos de saúde do bairro Araguaia e bairro da Paz, reforma do antigo Palacete Augusto Dias na Marabá Pioneira e pavimentação nos bairros Araguaia, Nossa Senhora Aparecida e São Félix 1 e 2. Deixamos junto ao Incra recursos de R$ 3.382.327,44 (três milhões, trezentos e oitenta e dois mil, trezentos e vinte e sete reais e quarenta e quatro centavos) para construção de pontes de concreto na zona rural e R$ 1.676.111,35 (hum milhão, seiscentos e setenta e seis mil, cento e onze reais e trinta e cinco centavos) para a recuperação de estradas vicinais. Estão empenhados no Ministério das Cidades R$ 3.064.724,50 (três milhões, sessenta e quatro mil, setecentos e vinte e quatro reais e cinquenta centavos) para a conclusão da pavimentação da avenida Sol do Oeste, nos bairros Bom Planalto e Novo Planalto, uma emenda do ex-deputado Asdrúbal Bentos, cuja obra já foi iniciada. E, por último, R$ 1.868.929,66 (hum milhão, oitocentos e sessenta e oito mil, novecentos e vinte e nove reais e sessenta e seis centavos) para a conclusão das obras de pavimentação da Estrada do Geladinho, também já em andamento.  Some tudo isso. Dá exatos R$ 302.811.485,61 (trezentos e dois milhões, oitocentos e onze mil, quatrocentos e oitenta e cinco reais e sessenta e um centavos). É muito dinheiro. Quase a metade de todo o orçamento de Marabá para um ano. Tudo isso recurso garantido. Não vou nem falar de mais de R$ 5 milhões de emendas parlamentares para serem liberadas, de cerca de R$ 500 mil que deve entrar nos próximos dias para o combate ao crack, uma emenda do deputado Beto Salame. Por isso afirmo, sem medo de errar, além das centenas de obras que inaugurei ainda entreguei o município muito melhor do que recebi!

O senhor está irritado com essa tentativa do novo governo de identificar sua gestão com o caos administrativo e financeiro?

Salame – Não. Compreendo o que eles estão fazendo. Quanto pior o quadro for pintado mais o que eles vão fazer vai aparecer. Justifica medidas duras em relação à folha de pagamento. Tenho boas relações com o Tião. Quando prefeito ele se revelou um bom gestor. O Tony, apesar de jovem, é inteligente, preparado e arrojado. Já mostrou competência à frente da Polícia Federal. Se herdar um pouco da habilidade do seu avô, o saudoso mestre Cunha, vai ser um grande homem público. Torço por eles e estou disposto a ajudar. Junto com meu irmão, o deputado Beto Salame, já estou vendo recursos para Marabá aqui em Brasília. Tem coisa grande e boa que pode ser anunciada a qualquer momento. Estou trabalhando nisso. Quero ajudar. Não quero conflito. Fiz o melhor que pude pagando uma fortuna de dívidas, enfrentando uma crise econômica brutal que está atingindo todos os municípios brasileiros e sem apoio algum do Governo do Estado. Inaugurei mais de 400 obras importantes. Isso dá uma média de uma obra a cada três dias de governo. Estradas, pontes, drenagem, asfalto, quadras, campos de futebol, postos de saúde, escolas, creches e várias outras obras se espalham de uma ponta a outra do município. Cometemos erros? Claro! Várias coisas eu faria diferente. Mas tenho a consciência tranquila que não errei de caso pensado, por negligência ou desonestidade. E sou orgulhoso do legado que deixei. Agora é sacudir a poeira e continuar ajudando Marabá em outra trincheira.